Donkey Kong, o gorila mais carismático do universo Nintendo, sempre teve uma história de desenvolvimento peculiar. Embora seja uma criação original da Big N, por décadas, sua identidade foi forjada, em grande parte, pelas mãos de outros estúdios. Entre eles, a Rare (ou Rareware, para os mais saudosistas) se destaca como a principal arquiteta de sua persona moderna, catapultando-o ao estrelato com o icônico Donkey Kong Country em 1994. Mesmo após anos de separação, é notável como o lançamento mais recente, Donkey Kong Bananza, ainda reverbera com a essência e as inovações que a Rare introduziu.
Um “Reboot” com Sabor de Casa
À primeira vista, Bananza parece um rompimento radical com o passado. Cenários subterrâneos, uma jogabilidade focada na destruição do ambiente e a inesperada parceria com uma Pauline rejuvenescida sugerem um “reboot” completo. No entanto, por trás dessa fachada de novidade, o game habilmente tece uma tapeçaria rica em referências e mecânicas que a Rare popularizou. É quase como se a Nintendo estivesse dizendo: “Sim, é novo, mas nunca esqueceremos de onde viemos… mesmo que tenhamos levado alguns anos para admitir abertamente a genialidade de terceiros!”
As Marcas Invisíveis da Rare no Gameplay
A influência da Rare em Donkey Kong Bananza não se limita a acenos sutis; ela permeia o próprio design do jogo, da funcionalidade aos elementos narrativos. Veja alguns exemplos:
- Balões de Vida: Elementos visuais e funcionais são vestígios claros. Os balões, por exemplo, que serviam como seu contador de vidas na série Country, retornam com uma função similar, resgatando o jogador de abismos sem fim. Uma lembrança útil de que, mesmo em um mundo novo, a gravidade ainda é sua inimiga número um.
- Cameos Nostálgicos: Personagens clássicos como Cranky, Diddy e Dixie Kong fazem aparições recorrentes, surgindo em momentos inusitados. Essas aparições não são meros easter eggs; elas reforçam a continuidade de um universo que a Rare ajudou a moldar.
- Trilha Sonora Icônica: Até mesmo a trilha sonora presta homenagem, mesclando faixas inéditas com clássicos imortais como “DK Island Swing” e o memorável “DK Rap”. É um deleite auditivo que une o antigo e o novo, provando que algumas melodias simplesmente não envelhecem.
A Filosofia de Design: De Sandboxes a “Bananza”
A influência mais profunda, no entanto, reside na própria filosofia de design de níveis. Enquanto Super Mario 64 estabeleceu a estrutura de missões pontuais, a Rare expandiu essa ideia com Banjo-Kazooie e o próprio Donkey Kong 64. Seus jogos ofereciam “caixas de areia” onde os colecionáveis estavam disponíveis desde o início, permitindo aos jogadores explorar livremente e retornar com as habilidades necessárias. Essa abordagem, que diferia da “expulsão para o hub” de Mario, foi eventualmente adotada pela Nintendo em títulos aclamados como Super Mario Odyssey e, agora, Donkey Kong Bananza. Uma espécie de “aprendi com o mestre”, mas em ritmo próprio, afinal, a Nintendo gosta de fazer as coisas à sua maneira.
A Música Como Ferramenta de Poder: De Bongôs a Vozes Divinas
Até ideias que parecem inteiramente novas em Bananza podem ter suas raízes na Rare. A ênfase na música, por exemplo, remete diretamente a Donkey Kong 64, onde cada Kong adquiria um instrumento musical (os bongôs de DK, a guitarra de Diddy) que, quando tocados em locais específicos, ativavam mecanismos ou eliminavam inimigos. Era uma forma engenhosa de integrar a música ao gameplay, transformando-a em uma ferramenta de poder.
Em Bananza, a voz poderosa de Pauline assume um papel análogo. Seu canto não só desencadeia as transformações “Bananza”, que são o coração da nova mecânica, mas também dispersa selos de “Vazio”, abrindo novas áreas a serem exploradas. No modo cooperativo, seus gritos são verdadeiras ondas de choque, destruindo terreno e inimigos. Uma bela evolução de uma ideia que, no fundo, é um “cover” muito bem executado, mas com uma roupagem moderna e um charme irresistível.
Um Legado Honrado e um Futuro Promissor
Donkey Kong Bananza é, sem dúvida, um passo ousado e inovador para a série. Contudo, ao invés de apagar as pegadas da Rare, a Nintendo optou por celebrá-las, incorporando-as de forma orgânica à nova identidade do jogo. Isso não é apenas uma homenagem nostálgica; é um reconhecimento tácito de que muitos dos elementos introduzidos pela Rare se tornaram, para o bem ou para o mal, intrínsecos à essência de Donkey Kong. Eles são parte de seu DNA virtual.
Com rumores de um filme à vista, a Nintendo claramente investirá pesado no futuro do gorila. E uma coisa é certa: não importa onde DK vá, um pedacinho da Rareware sempre estará em seu DNA, garantindo que o legado do macacão carismático continue a ser tão robusto quanto sua própria força.