Por décadas, a imagem dos videogames esteve associada a preocupações: olhos grudados na tela, sedentarismo, e até o temido “emburrecimento”. Pais, educadores e a sociedade em geral frequentemente veem o tempo de tela como um inimigo do desenvolvimento saudável. No entanto, o que aconteceria se a ciência nos apresentasse uma perspectiva surpreendentemente diferente, desafiando essa narrativa convencional?
Um estudo recente, conduzido pelo renomado Instituto Karolinska na Suécia – uma instituição com reputação impecável na pesquisa médica – e publicado com destaque na ScienceAlert, lançou uma nova luz sobre essa discussão. A pesquisa sugere uma conexão fascinante entre o hábito de jogar videogames regularmente e um possível incremento no Quociente de Inteligência (QI) em crianças. Sim, você leu certo: a atividade digital que muitos veem com desconfiança pode, na verdade, estar exercitando mentes jovens de maneiras inesperadas.
Para chegar a essas conclusões, os cientistas acompanharam cerca de 5 mil crianças americanas, todas com 10 anos de idade no início do experimento. O nível de suas habilidades intelectuais foi cuidadosamente registrado, e os pesquisadores monitoraram as mudanças ao longo de um período de dois anos. Os resultados foram, no mínimo, intrigantes: enquanto as crianças que passavam tempo assistindo televisão ou navegando em redes sociais não demonstraram alterações significativas em suas capacidades cognitivas, o grupo que dedicava cerca de uma hora diária aos videogames apresentou um ganho médio de 2,5 pontos no QI.
É crucial ressaltar: os pesquisadores não apontam para uma relação de causa e efeito direta, ou seja, não estão afirmando que jogar videogames causa o aumento do QI. Contudo, o efeito observado é estatisticamente significativo e persistente, mesmo após a consideração de diversos fatores que poderiam influenciar o resultado, como predisposições genéticas e o nível socioeconômico das famílias dos participantes. Isso significa que a correlação é robusta e digna de atenção, sugerindo que, no mínimo, videogames não são o inimigo que se pintava, e podem ser até um amigo discreto.
Mas, afinal, por que os videogames poderiam ter esse efeito? Ao contrário da passividade de assistir a um programa de TV, muitos videogames exigem um estímulo contínuo e multissensorial. Eles demandam raciocínio rápido, estratégia complexa, resolução de problemas em tempo real, coordenação motora fina e até mesmo habilidades sociais em jogos multiplayer. É um cenário onde a tomada de decisão é constante, o planejamento é recompensado e a adaptação é fundamental para o sucesso. Tais atividades podem, teoricamente, funcionar como um verdadeiro “treino cerebral”, estimulando regiões do cérebro associadas à memória, lógica e processamento de informações, forçando a mente a ser ágil e criativa.
É quase irônico pensar que, enquanto nos preocupávamos com o “vício” digital e o isolamento, uma parte dessa mesma tecnologia estava, silenciosamente, exercitando a mente de nossos pequenos de uma forma que o sofá e a TV não conseguem igualar. Parece que a velha máxima “tudo em excesso faz mal” ainda se aplica, mas a moderação e a qualidade da interação com a tela são a chave, e não a tela em si.
A mensagem final, portanto, não é incentivar maratonas de jogos até o amanhecer, nem dispensar outras formas de aprendizado e interação. É, sim, repensar o potencial dessa ferramenta digital. Talvez seja hora de ver os videogames não apenas como uma forma de entretenimento, mas como uma atividade que, quando bem gerenciada e balanceada com outras formas de desenvolvimento, pode de fato contribuir para o desenvolvimento cognitivo. A era digital, talvez, seja mais complexa e cheia de nuances do que os primeiros alarmes nos fizeram crer, e o futuro da inteligência infantil pode ter pixels e controles em seu horizonte.